Por Yago Itaparica
Sobre
as nossas cabeças as palmeiras dançam ao silvo do vento, mas ninguém as veem,
no entanto eu sei que elas existem, assim como sei que essas pessoas estão
aqui, pessoas estas que sequer podem vislumbrar esse algo estranho que se aloja
descaradamente entre nós. O que há de diferente entre elas e as palmeiras sobre
suas cabeças?
Já
não sei se eu que sou louco e me perdi entre... essas coisas; isso, que não
saberei explicar. Olha pra eles! O que enxergam? Não passam de tolos; eis a
única palavra que pode descrevê-los. Não, não é verdade. Alguma coisa de fato
é?
Bem,
não me dei o trabalho de empunhar uma caneta para tratar de assuntos sem
solução. Faço-o para relatar, relatar esse evento deles. Como banal é tudo
isso, enfim...
É
uma noite de sexta-feira como outra qualquer, a lua paira no céu, mas ninguém a
vê, definitivamente. O clima é ameno, o que dá ao lugar ares de drama e perigo
à espreita. É a hora perfeita para perder-se do mundo. Na praça matriz, no
início da noite, as pessoas montam, sem muita pressa, a pequena feira. Logo
mais dois professores de filosofia da Universidade local terão a fala. Graças a
este céu estrelado, eles não estão sendo bem entendidos, caso contrário,
estragariam algumas vidas. Nós não estamos preparados, ninguém lhes avisou!
Ousaram
falar sobre “Poder e Sujeição” na perspectiva do pensamento de Foucault. E
veja, em praça pública, isto é, sem dúvidas, uma afronta; a quem? À estrutura
social que nos cerca e a esses que as mantêm.
A
primeira convidada a falar foi Giovana Temple, uma professora, feiticeira que
sabe conjurar muito bem as palavras, o prejuízo que isso pode causar a uma
mente atenta e meditativa é aterrador. Cada palavra é uma punhalada, evocando a
voz de La Boétie, Foucault, vai descortinando as relações sociais defronte a
plateia, que ouve como quem escuta uma canção de ninar, sua macia e graciosa
voz esconde temerárias armadilhas, de efeitos controversos; destrancam pesados
cadeados em nossa mente. Por trás desse discurso existem camadas de
interpretações e entendimentos. Quanto mais fundo chegues, mais desamparado
estarás. Se queres uma vida tranquila, sem grandes preocupações e riscos, não a
ouça, sujeite-se a uma vida rasa e sem sumo. Mas, se queres caos e perigo
constante, entregue-se ao canto da sereia.
Cícero
Josinaldo, arguto tal qual a outra, utiliza-se de sua voz como debatedor,
cauteloso, ateando querosene na fogueira erguida por sua antecessora, aquela
que em outros mundos é conhecida como a voz dos bosques noturnos. Mais alguém
pode ver o perigo e a loucura que, se pensarmos conforme esperam de nós, eles
representam! A minh’alma eufórica ri, eu vejo o desastre se aproximando, o
bonde vem chegando, as chamas queimarão qualquer resquício de debilidade, o
fogo arde e queima, corrói e dói, é dor de purificação, é lava que queima no
ventre, se queres saber.
O
que fizeram de nós? Esses grandes pilares sustentados por poucos tijolos, estes
que conduzem o trem no trilho.
É
tarde demais, foi feito. Agora ambos se banqueteiam (os professores), frente a um público que recebe apático toda essa problemática.
Exceto por alguns que percebem e compreendem esse cubo mágico que lhes é
apresentado. Mas e na hora de resolvê-lo, quem tem bravura suficiente para pôr
em mãos este ardiloso objeto e sublimar suas consequências?
Tudo
ocorreu perfeitamente. A plateia colocara questões, as quais são prontamente
respondidas, e a roda deste rodão continua a rodar. As pessoas se deleitam, bem
como os comunicadores, evidentemente não da mesma forma. Há um furor profundo
nestes últimos. A feirinha ainda é feirinha, as conversas são as mesmas, assim
também as pessoas, a praça ainda é bela, embora tenha passado por uma
turbulência, poucos a sentiram. O chão sob meus pés ainda treme, amparo-me no
cotidiano. Fica tudo bem, todos estão bem, como deve ser. A fogueira acabara de
ser apagada. O Café Filosófico foi um sucesso, todos os organizadores estão
satisfeitos como sempre, já se ouve os sorrisos, tudo acontece como se nada
houvesse ocorrido. Desarruma-se tudo, como tem de ser.
Acabou o evento, até um
próximo.
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No fim das contas, estamos todos perdidos.