terça-feira, 23 de outubro de 2018

"PODER E SUJEIÇÃO EM FOUCAULT"



Por Yago Itaparica

Sobre as nossas cabeças as palmeiras dançam ao silvo do vento, mas ninguém as veem, no entanto eu sei que elas existem, assim como sei que essas pessoas estão aqui, pessoas estas que sequer podem vislumbrar esse algo estranho que se aloja descaradamente entre nós. O que há de diferente entre elas e as palmeiras sobre suas cabeças?

Já não sei se eu que sou louco e me perdi entre... essas coisas; isso, que não saberei explicar. Olha pra eles! O que enxergam? Não passam de tolos; eis a única palavra que pode descrevê-los. Não, não é verdade. Alguma coisa de fato é?

Bem, não me dei o trabalho de empunhar uma caneta para tratar de assuntos sem solução. Faço-o para relatar, relatar esse evento deles. Como banal é tudo isso, enfim...

É uma noite de sexta-feira como outra qualquer, a lua paira no céu, mas ninguém a vê, definitivamente. O clima é ameno, o que dá ao lugar ares de drama e perigo à espreita. É a hora perfeita para perder-se do mundo. Na praça matriz, no início da noite, as pessoas montam, sem muita pressa, a pequena feira. Logo mais dois professores de filosofia da Universidade local terão a fala. Graças a este céu estrelado, eles não estão sendo bem entendidos, caso contrário, estragariam algumas vidas. Nós não estamos preparados, ninguém lhes avisou!

Ousaram falar sobre “Poder e Sujeição” na perspectiva do pensamento de Foucault. E veja, em praça pública, isto é, sem dúvidas, uma afronta; a quem? À estrutura social que nos cerca e a esses que as mantêm.

A primeira convidada a falar foi Giovana Temple, uma professora, feiticeira que sabe conjurar muito bem as palavras, o prejuízo que isso pode causar a uma mente atenta e meditativa é aterrador. Cada palavra é uma punhalada, evocando a voz de La Boétie, Foucault, vai descortinando as relações sociais defronte a plateia, que ouve como quem escuta uma canção de ninar, sua macia e graciosa voz esconde temerárias armadilhas, de efeitos controversos; destrancam pesados cadeados em nossa mente. Por trás desse discurso existem camadas de interpretações e entendimentos. Quanto mais fundo chegues, mais desamparado estarás. Se queres uma vida tranquila, sem grandes preocupações e riscos, não a ouça, sujeite-se a uma vida rasa e sem sumo. Mas, se queres caos e perigo constante, entregue-se ao canto da sereia.

Cícero Josinaldo, arguto tal qual a outra, utiliza-se de sua voz como debatedor, cauteloso, ateando querosene na fogueira erguida por sua antecessora, aquela que em outros mundos é conhecida como a voz dos bosques noturnos. Mais alguém pode ver o perigo e a loucura que, se pensarmos conforme esperam de nós, eles representam! A minh’alma eufórica ri, eu vejo o desastre se aproximando, o bonde vem chegando, as chamas queimarão qualquer resquício de debilidade, o fogo arde e queima, corrói e dói, é dor de purificação, é lava que queima no ventre, se queres saber.

O que fizeram de nós? Esses grandes pilares sustentados por poucos tijolos, estes que conduzem o trem no trilho.

É tarde demais, foi feito. Agora ambos se banqueteiam (os professores), frente a um público que recebe apático toda essa problemática. Exceto por alguns que percebem e compreendem esse cubo mágico que lhes é apresentado. Mas e na hora de resolvê-lo, quem tem bravura suficiente para pôr em mãos este ardiloso objeto e sublimar suas consequências?

Tudo ocorreu perfeitamente. A plateia colocara questões, as quais são prontamente respondidas, e a roda deste rodão continua a rodar. As pessoas se deleitam, bem como os comunicadores, evidentemente não da mesma forma. Há um furor profundo nestes últimos. A feirinha ainda é feirinha, as conversas são as mesmas, assim também as pessoas, a praça ainda é bela, embora tenha passado por uma turbulência, poucos a sentiram. O chão sob meus pés ainda treme, amparo-me no cotidiano. Fica tudo bem, todos estão bem, como deve ser. A fogueira acabara de ser apagada. O Café Filosófico foi um sucesso, todos os organizadores estão satisfeitos como sempre, já se ouve os sorrisos, tudo acontece como se nada houvesse ocorrido. Desarruma-se tudo, como tem de ser. 

Acabou o evento, até um próximo.

- No fim das contas, estamos todos perdidos.