sábado, 19 de setembro de 2009

SEM CONSTRANGIMENTO
Por Led Beslard


Foto: Lorena Hirsch

Comentei outro dia sobre minha surpresa e contentamento em encontrar fora de Salvador o guitarrista Daniel Dattoli. Apesar da razoável distância entre nossas residências, posso considerá-lo meu visinho. Afinal, a cidade não é tão grande assim.

Na Cobalto, banda que se destacou dentro e fora do Brasil, Daniel empunhava sua guitarra com personalidade, deslanchando riffs agressivos, combinados a melodias marcantes e solos bem posicionados. Tudo isto, agregado às boas composições, execuções afiadas e profissionalismo de todo o grupo, rendeu à banda e a Daniel críticas positivas, além de um crescente número de fãs que lotavam as casas de shows para vê-los.

Em tempos de banda, nos cruzamos algumas vezes participando dos mesmos eventos, mas sem muitos diálogos. Atualmente, pudemos conversar e até perceber algumas coincidências em nossos caminhos. Somos guitarristas, casados, nos afastamos de nossas bandas (sem nos distanciarmos da música), buscamos estabilidade e segurança em nossas atividades profissionais, moramos na mesma cidade, e, o mais interessante, criamos gatos.

Aqui, Daniel Dattoli nos fala descontraídamente sobre suas experiências musicais, sua saída da Cobalto e planos futuros. Perceba, reflita, comente e repasse.

NEW BRUTALITY – Quando você descobriu que queria montar uma banda de rock?
DANIEL DATTOLI –
Bem, no meu caso não sei se foi bem uma escolha. A coisa meio que aconteceu naturalmente. Eu conheci o Chris (baixista) no colégio, e na época eu nem escutava metal. As coisas mais pesadas que eu escutava eram bandas tipo, Guns n’ Roses, The Cult, e coisas do gênero. Ele me mostrou bandas como Metallica, Pantera, Megadeth, e no início eu admito que achei Pantera muito pesado (risos). Foi então que Chris e nosso primeiro baterista, Renato Ribeiro, resolveram fazer uma banda pra tocar em um festival que ia rolar no colégio e então me chamaram, pois eu era o único que sabia tocar alguma coisa. Nessa época a banda se chamava Altered State (risos).

NB – Quais são seus guitarristas prediletos? Por quê?
DANIEL –
Gosto muito de guitarristas com identidade, e que de alguma forma criam sua marca registrada em tudo que tocam. Entre os vários guitarristas que eu admiro, eu destaco Dimebag (Pantera), por ter sido um divisor de águas pra meu jeito de tocar, e pra quem gosta de som pesado; Zakk Wylde, pela postura de palco e por sua técnica; Jimmy Page, por seu experimentalismo, mas também admiro muitos outros, por suas composições ou por sua identidade ao tocar.

NB – Quais bandas nacionais e internacionais você admira?
DANIEL –
Isso depende muito da minha fase, mas Pantera, Metallica e Sepultura, realmente mudaram minha vida. Mas gosto e admiro muitas bandas que para mim fazem um trabalho competente.

NB – Como você se define como guitarrista?
DANIEL –
Pergunta difícil essa! Acho que sou um guitarrista esforçado. (risos)

NB – Você acredita que uma boa composição acontece por inspiração ou prática?
DANIEL –
Acho que o bom processo criativo se dá primeiro pela inspiração, e a prática e técnica ajudam no processo. Porém, as coisas feitas apenas pela técnica e prática e sem inspiração não têm a mesma emoção e acho que isso é passado pra composição também. Fica tudo meio insosso, sem graça. Acho também que pra compor contam mais uma boa mecânica e um bom ouvido, do que qualquer teoria.

NB – Para você quais as principais diferenças entre os discos “Elemental” e “Metamorphic” da Cobalto, além da mudança dos vocalistas?
DANIEL –
O “Elemental” é uma verdadeira colcha de retalhos. São músicas de diversas fases da banda que foram todas adaptadas para que não ficassem sem unidade, isso fez com que o resultado final, pelo menos pra mim, não fosse satisfatório. Já o “Metamorphic”, além de todas as músicas terem sido feitas na mesma fase da banda, nós estávamos mais afiados com os instrumentos por causa da turnê européia, isso se refletiu em composições mais trabalhadas. Essas são as principais diferenças pra mim, sem contar, é claro, a diferença técnica dos vocais. Mas isso não significa que não tivemos problemas no “Metamorphic”, pois nós tivemos apenas três meses pra compor e gravar o disco, e isso fez com que alguns detalhes técnicos da gravação e nas próprias composições fossem deixados de lado, ou passassem desapercebidos, e mais uma vez pra mim o resultado não foi 100% satisfatório. Mas, um dia eu gravo algo que eu fique 100% satisfeito com o resultado final. (risos)

NB – Recentemente, a Cobalto anunciou oficialmente sua nova formação, mas nada se falou sobre sua substituição. O que motivou sua saída da banda?
DANIEL –
Eu acredito que falaram da minha saída sim, mas esperaram ter um substituto para que isso fosse passado para mídia especializada, o que é normal. E ao contrário do que muitos pensam, minha saída foi amigável, pois já tinha deixado a vaga de guitarrista à disposição, e deixei claro que a banda não era mais minha prioridade. Mas respondendo a pergunta... eu saí por vários motivos. Um deles foi não querer ficar mais preso às incertezas. Minha paciência com certas coisas também se esgotou. Outras situações da cena também ajudaram na minha decisão. Mas eu não parei de tocar! Pretendo continuar na música, mas sem pretensões, apenas por gostar de tocar mesmo, sem ligar muito para qualquer tipo de retorno ou crítica. Estou montando meu estúdio em casa e aos poucos e no tempo certo colocarei meus projetos em prática.

NB - Quais são seus planos futuros para a música?
DANIEL –
Como disse, a primeira coisa é montar meu estúdio onde vou poder gravar minhas idéias. Mas, planos mesmo eu não tenho não. Só quero me divertir fazendo o que gosto.

NB – Com a Cobalto você teve a oportunidade de tocar fora do Brasil dividindo palcos com bandas já consagradas no metal. Qual foi o momento mais emocionante?
DANIEL –
Sem nenhuma duvida, foi o Masters Of Rock, na Republica Tcheca. Tocar ao lado de uma lenda do rock como o White Snake e nomes consagrados como Kreator, Rage, Evergrey, Master Plan, foi realmente, surreal. Ali eu tive a oportunidade de sentir o gostinho de ser rock star. (risos)

NB – Além de músico você também é designer, e acaba de produzir a capa do novo disco do guitarrista Ricardo Primata. Você pretende seguir essa carreira?
DANIEL –
Eu já trabalhava como designer antes, pois sou formado em desenho industrial, e já usava o design com a Cobalto, fazendo as artes gráficas, logos e tudo que envolvia criação. No caso de Ricardo, eu já o conhecia como amigo e músico, e acabou rolando essa parceria no novo trabalho dele, que por sinal está um disco muito bom. Mas eu não sigo a carreira de designer, apenas faço alguns trabalhos quando me sobra tempo.

NB – Com a experiência que você adquiriu durante anos na Cobalto, tanto em estúdios quanto fazendo shows, quais dicas você deixa para quem está começando e terá que passar por esses processos?
DANIEL –
Pelas experiências que tive, o que posso dizer é que é muito importante analisar tudo que se faz várias vezes. Fazer uma pré-produção antes de gravar pra que você monte suas idéias e que você as reveja mais de uma vez é extremamente importante. Todos os detalhes em uma gravação acabam contando no final, e definitivamente a pressa é um inimigo mortal para qualquer gravação. É sempre bom ter um engenheiro de som competente e que entenda também do seu estilo musical, para produzir o seu álbum. Não preciso nem falar que a banda tem que estar bem ensaiada para gravar. Já no quesito show, eu acho que isso é muito particular de cada banda, não há fórmula para um bom show. Cada banda tem seu estilo de tocar.

NB – Em seu ponto de vista, o que realmente é necessário para a cena rocker baiana evoluir e crescer?
DANIEL –
É uma pergunta complicada essa!! Mas eu acho que quem gosta de um tipo de som que para nossa cultura é algo “alternativo”, como no caso do rock, o melhor caminho é a união entre as vertentes para que se possa produzir resultados maiores. Essa disseminação de estilos, cada qual fazendo sua cena só enfraquece o todo, que já é minoria no pais do carnaval. Mas no fundo eu sei que é uma evolução impossível de acontecer aqui na Bahia, pois nós ainda temos uma mentalidade muito atrasada e formadores de opinião ainda jurássicos que não permitem que esta evolução aconteça. O negocio é torcer para que as próximas gerações tenham uma cabeça e educação melhores.

4 comentários:

Val disse...

boa entrevista! boa sorte pra ele!!!!

Jera Cravo disse...

Um dos guitarristas mais talentosos com quem já toquei, trabalhei e convivi.

Désir Essentiel disse...

Apesar de não seguir a carreira de designer, é incontestável o talento do moço. Sua belíssima arte pode ser, felizmente, encontrada em vários locais... Inclusive em nossa loja. Decerto, se o foco do mesmo é a música, podemos esperar boas novidades vindo por aí. ^^

Daniel DECOMPOSER disse...

Bela entrevista Daniel, espero que seja tão capaz em seu desconhecido futuro profissional, quanto o guitarrista que conhecemos!

E adimiro sua coragem em reconhecer que o Rock 'n' Roll não e cultura nossa! "Tomamos para nós a cultura de terceiros, e tentamos usufruir da maneira que bem entendemos!



Forte abraço!